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Alerta

Cerca de 30% da população rural do Caparaó apresenta sintomas de depressão

"Alarmante. A situação é mais grave em Muniz Freire, onde o índice chegaa 80%. Levantamento é resultado de pesquisa da Ufes-Alegre"

por Redação Conexão Safra

em 25/09/2017 às 0h00

5 min de leitura

Cerca de 30% da população rural do Caparaó apresenta sintomas de  depressão


Lucas Schuina
De Alegre

Um levantamento realizado por pesquisadores do Campus de Alegre da
Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes-Alegre) aponta que cerca de
30% dos moradores de áreas rurais do Caparaó capixaba apresentam
sintomas de depressão. Muniz Freire é o município com o percentual mais
alto, próximo de 80%.

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A constatação surgiu do trabalho do Programa Pesquisa para o SUS
(PPSUS), projeto federal em vigência na universidade que visa fomentar o
monitoramento de saúde aliado à pesquisa científica no país. O PPSUS de
Alegre reúne pesquisadores de diversas áreas de conhecimento, que
atenderam aproximadamente mil pessoas de 28 comunidades rurais nos
últimos quatro anos, aplicando um questionário com mais de 600 perguntas
e realizando avaliações clínicas.

Os resultados da pesquisa se referem a sintomas depressivos que incluem
ideação suicida, mas não remetem a casos de pessoas diagnosticadas com a
doença. “Apesar disso, é quase certo que essas pessoas teriam diagnóstico
de depressão se fossem a um especialista ”, ressalta a professora do curso de
Ciências Biológicas da Ufes-Alegre Adriana Madeira, coordenadora do
PPSUS.

Um dos principais fatores apontados como causador dos sintomas é o alto
volume de agrotóxicos utilizados na agricultura. Segundo Adriana Madeira,
o Glifosato, um herbicida com grau elevado de toxicidade e proibido na
Europa, mas liberado no Brasil, é o mais usado nas lavouras da região.
A relação direta entre agrotóxicos e depressão não é uma novidade para a
comunidade científica. Entretanto, pesquisadores ainda quebram a cabeça
para entender de que forma os defensivos agrícolas contribuem para o
surgimento da doença.

“Uma das possibilidades é que o uso de agrotóxicos aumenta a quantidade
de sintomas de doenças. O fato de o sujeito usar agrotóxico torna a saúde
dele mais precária. A saúde mais precária, somada às condições de vida no

campo, torna a percepção desses indivíduos sobre si mesmos pior ”, explica
Madeira.
“Existem duas perguntinhas-chave no questionário. Em uma delas, é
questionado se a pessoa apresenta alguma doença crônica. A outra, se a
saúde autorrelatada é boa ou ruim, ou seja, se ela se enxerga como alguém
doente ”, complementa a neurocientista Catarine Conti, pesquisadora da
Ufes que atua no PPSUS.
Conti adiciona ainda a hipótese de o agrotóxico interferir diretamente nas
substâncias bioquímicas do organismo e ocasionar os sintomas, mesmo que
os estudos nesse sentido ainda não tenham encontrado respostas
consensuais. “Essas substâncias tóxicas são absorvidas ao entrarem em
contato com as pessoas. E os agricultores da região praticamente não usam
EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) ”, afirma.

Mulheres

Os sintomas de depressão foram verificados com maior frequência no
público feminino. As pesquisadoras avaliam que isso se deve à falta de
autonomia das mulheres na região, que têm pouca independência financeira
e social. As opções de lazer para elas também são escassas. “Muitas
disseram terem como única atividade de lazer ir à igreja ”, relata Adriana
Madeira.

As mulheres também estão sujeitas aos malefícios dos agrotóxicos, mesmo
que a maioria não trabalhe nas lavouras, pois elas são, em geral,
responsáveis por lavar as roupas dos maridos que manipulam os defensivos
agrícolas. Outro agravante é a insegurança alimentar, que aflige 25% dos
moradores da zona rural do Caparaó. Quando as famílias passam por esse
tipo de situação, as mulheres tendem a se alimentar menos para deixar
comida para o marido e os filhos, pois se sentem na obrigação social de
proceder dessa maneira.
Muniz Freire

Duas causas principais podem estar na origem do índice especialmente
elevado de pessoas com sintomas de depressão em Muniz Freire. Um deles
é o relativo isolamento geográfico do município, que tem estradas de
acesso precárias e não é cortado por nenhuma rodovia de grande
importância, desestimulando o tráfego e o contato com pessoas de outras
cidades. A outra causa remete às atividades agrícolas e, mais uma vez, aos
agrotóxicos. Entre os produtos mais cultivados no município estão as hortaliças,

que têm resistência menor a pragas, estimulando ainda mais a
utilização de defensivos agrícolas
No último dia 19 de agosto, uma reunião foi realizada em Muniz Freire por
iniciativa de representantes locais da Igreja Católica. Adriana Madeira e o
pesquisador Geraldo Dutra, pós-graduando em Agroecologia pelo Ifes de
Alegre, falaram para aproximadamente 80 pessoas sobre os benefícios da
agroecologia e da adoção de hábitos de vida mais saudáveis, dentre outros
assuntos. “Queremos que a pesquisa ajude a mudar a vida das pessoas, não
fique só restrita ao ambiente acadêmico ”, comenta Adriana.
Área urbana

Os pesquisadores do PPSUS também direcionaram suas atenções para os
moradores da área urbana do Caparaó, tendo como referência de estudo
Alegre, que está entre os municípios com maior consumo de
antidepressivos no Espírito Santo. Os dados estão sendo analisados, mas
uma visão prévia aponta um número ainda maior de pessoas com sintomas
de depressão nas cidades.



Legenda foto reunião: Professora Adriana Madeira deu palestra este mês para
muniz-freirenses sobre hábitos saúdes e melhores práticas na agricultura.
Crédito:
Divulgação
Legenda foto geral: Isolamento geográfico é um fator agravante para moradores de
Muniz Freire, sobretudo na área rural.
Crédito: João Paulo Coelho

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